O prefeito de Riolândia, Sávio Nogueira Franco Neto, 46, tem uma postura original em relação à construção de unidades prisionais em seu município: enquanto a esmagadora maioria dos prefeitos paulistas foge dessa perspectiva como o diabo foge da cruz, Neto, como é conhecido, procura ver o lado positivo da questão, que, se bem conduzida, pode gerar progresso para a sua comunidade. Comerciante, ex-vereador, vice-prefeito por duas vezes, Neto é casado, tem dois filhos e se elegeu em 2008 pelo PSB. Em visita a CIDADÃO, concedeu esta entrevista exclusiva, na qual o tema é exatamente o sistema prisional.
CIDADÃO: Aparentemente, o sr. está na contramão de uma tendência dos prefeitos paulistas, a de não querer presídios em seus municípios. Afinal, Riolândia já tem um presídio, e o sr. quer levar outro. Por quê?
NETO: Primeiramente, pela questão do emprego. Antes, porém, é bom frisar que não é bem assim, que eu quero trazer a penitenciária. Os critérios do Estado são técnicos, há um estudo com estatísticas e tudo o mais, como o número de mandados de prisão, e a necessidade de criar vagas no sistema prisional. Para o Estado, o ideal é não deslocar o preso para regiões distantes. Na nossa região, há carência de unidades prisionais, a cadeia central de Votuporanga, por exemplo, vai ser desativada. Então, esse CDP (Centro de Detenção Provisória) vem para desativar essas cadeias regionais, como já ocorreu em Fernandópolis, e concentrar os presos da região, no caso de condenação.
CIDADÃO: Que tipo de unidade é essa que já existe em Riolândia?
NETO: É uma penitenciária fechada, de segurança máxima. O Estado trabalha com uma planta que é a mesma para a unidade compacta e para o CDP. Pela conversa que houve com representantes do governo, sentimos que a possibilidade maior é de que seja construído um CDP, com uma pequena, remota possibilidade de que seja um CDP feminino. Para nós, é indiferente.
CIDADÃO: Quantos funcionários há na unidade que já está funcionando?
NETO: Trezentos funcionários, todos trabalhando. O futuro presídio também terá um número equivalente. Nós não falamos disso, mas a capacidade será para 796 presos. Quando as duas unidades estiverem em funcionamento, comportarão 1500, 1600 detentos.
CIDADÃO: Qual é a média salarial desses servidores?
NETO: R$ 2.200,00, salário inicial. Ganham mais do que um PM de carreira. Boa parte desse dinheiro fica no município cerca de 50% - porque há os funcionários que viajam e os que moram em Riolândia.
CIDADÃO: Muita gente argumenta que, como esses cargos são supridos por concurso público, pode ocorrer de nenhum literalmente nenhum morador da cidade dotada de presídio passar no concurso. Qual é o seu contra-argumento?
NETO: Eu digo o seguinte: nós saímos na frente. Muita gente de Riolândia se interessa em fazer a prova, tanto que, no último concurso, 250 pessoas da cidade foram fazer a prova em São José do Rio Preto, a prefeitura ajudou no transporte. Nós estamos preparando os interessados em cursos próprios, para que eles estejam à frente da maioria. A perspectiva real da construção de um novo presídio motiva os estudantes a se prepararem para o concurso.
CIDADÃO: O que a lei dispõe sobre os gastos do presídio, como alimentação? A licitação é feita entre empresas da cidade?
NETO: Pode ser da cidade e pode ser de fora. É pregão eletrônico. A comida tem que ser feita dentro da unidade. Faz-se um pregão público para comprar os produtos. Como Riolândia é uma cidade pequena, ninguém se preparou ainda para a licitação, mas há um dinheiro que é gasto no comércio local: trata-se do pecúlio dos presos, dinheiro que eles ganham trabalhando ou recebem da família. Assim, eles podem comprar aquilo que o presídio não fornece, como sabonetes, pentes, chocolates...Esses recursos chegam a R$ 30 mil por quinzena, e são gastos no comércio de Riolândia.
CIDADÃO: O sr. viu nascer a unidade prisional de Riolândia. Teve algum caso grave de violência, que trouxesse insegurança para a população?
NETO: Aquela agitação, com deslocamento de tropas e tudo mais, só acontece quando fazem operações pente-fino. Só houve um caso de fugas, só que os fugitivos não sabiam direito onde estavam nem pra onde ir. A penitenciária tem um acesso secundário por terra e outro pelo centro da cidade. Então, se você sair da unidade, verá à direita Riolândia e à esquerda o Rio Grande. Houve uma falha no esquema de segurança até hoje não apurada e entrou uma arma no presídio, talvez junto com um caminhão que entrou para descarregar mercadoria. Eles renderam o motorista do caminhão e mais uns seis agentes penitenciários. Fizeram uma pressão tão grande que os funcionários acabaram abrindo o portão, coisa que não poderiam fazer. Os caras fugiram, viraram à esquerda e deram de cara com o rio. Dali a pouco a polícia chegou. No conflito, morreram dois presos e os outros quatro fugitivos foram levados de volta ao presídio. Outra fuga aconteceu no transporte de presos, logo no início do funcionamento da penitenciária. Um preso conseguiu abrir a algema dentro do camburão. Havia três lombadas na estrada (hoje não existem mais). A cada lombada, dois ou três presos pulavam fora. Mas todos foram recapturados. Os próprios presos comentam que de Riolândia é difícil fugir, porque toda a comunidade denuncia os fugitivos.
CIDADÃO: Quais são os reflexos sociais da presença das famílias dos presos na cidade? Isso não causa problemas no atendimento da Saúde, por exemplo?
NETO: Essa questão da saúde acontece mais nos finais de semana, quando vêm 200 ou 300 pessoas para visitar os parentes. Isso acaba sobrecarregando a Santa Casa. Só que, além de termos que considerar que eles aquecem o comércio, essa história de familiar de preso tem muito de folclore. Geralmente, quem vem é o pai, a mãe, gente já aposentada, que sabe que se os familiares começarem a dar trabalho na cidade, o serviço social acaba transferindo o detento. E eles não querem que o filho seja transferido para regiões distantes, porque não tem recursos para visitá-lo. Os presos são pobres demais. Acho que nem 5% têm uma condição financeira razoável.
CIDADÃO: A deputada estadual Ana Perugini, do PT, apresentou um projeto na Assembléia Legislativa que obriga o Estado a executar ações compensatórias e de minimização dos efeitos negativos gerados por unidades prisionais, nos municípios onde são instaladas. O sr. tem conhecimento desse projeto?
NETO: Sim, inclusive nós participamos de várias audiências públicas em São Paulo para tratar do assunto. Na essência, é um projeto que ajuda bastante. Veja: Fernandópolis, por exemplo, não é obrigada a ter uma cadeia só que a cidade terá que pagar para quem tem, porque, afinal, há bandidos de Fernandópolis em Riolândia e em outros presídios por aí. Está sendo criado um mecanismo compensatório para melhorar a imagem da cidade dotada de presídio, porque, se você perde em alguns aspectos, ganha em outros. Na imagem, por exemplo. Riolândia é uma cidade que tem possibilidades de, um dia, vir a ser um pólo turístico. A existência do presídio cria aquela barreira: Ah, Riolândia tem uma cadeia! Essa medida compensatória é excelente, a deputada está de parabéns pela iniciativa, e os deputados com quem a gente conversa, parecem estar de acordo com essa compensação. Fazer cadeia, melhor seria se não fosse necessário. Mas essa é a realidade e a gente tem que pensar na segurança da população.
CIDADÃO: A regionalização dos presídios racionalizará o sistema prisional?
NETO: Com certeza. Os prefeitos vivem um tipo de problema que é o seguinte: os parentes procuram o serviço social do município pedindo passagens para visitar presos que estão em cidades distantes 300, 400 quilômetros. A regionalização facilitará e barateará essas visitas. Tem preso de Riolândia que está em outras cidades, isso não é racional, já que ali existe uma cadeia. Se houver a regionalização, todo mundo ganhará.
CIDADÃO: Prefeitos de outras cidades já o consultaram sobre a questão de ter um presídio na cidade?
NETO: Uns dois ou três já me procuraram. Quando lhes falo dos fatores positivos, eles até que ficam tentados a comprar a ideia, mas o que predomina no final é o seguinte: político, normalmente, tem medo da população, ou de adotar uma medida que desagrade à população. O Mario Covas dizia: você tem que fazer aquilo que precisa ser feito. Para isso, é preciso ter coragem. A pressão política da população às vezes faz com que o prefeito, indiretamente, tire do seu cidadão uma oportunidade de emprego.